Nesta semana, os Estados Unidos anunciaram um apoio financeiro à Argentina, que está há anos afundada em uma grave crise em sua economia, mas vem tentando se reerguer com a gestão do libertário Javier Milei. Segundo o governo de Donald Trump, a Casa Branca usará “todas as opções” para impulsionar o país aliado sul-americano.
Em contrapartida, o Brasil vive uma relação cada vez mais deteriorada com a administração republicana, que em julho anunciou altas tarifas sobre importações brasileiras. Na ocasião, Trump deixou claro que o tratamento dado ao ex-presidente Jair Bolsonaro pela justiça brasileira era um dos principais motivos para a medida.
Os contrastes na relação com a Argentina e Brasil
Na quarta-feira (24), o secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, detalhou o plano para resgate econômico da Argentina. Os países implementarão um programa de troca de moedas (linhas de swap) de US$ 20 bilhões para ajudar a estabilizar a economia argentina.
Antes do anúncio, Javier Milei se encontrou com Donald Trump, nos Estados Unidos. Na ocasião, o republicano chamou Milei de “excelente líder” e declarou apoio total ao seu governo e à sua reeleição em 2027.
Horas antes nas redes sociais, Trump já havia exaltado o libertário argentino, dizendo que o considerava um “líder fantástico e poderoso“, além de um “grande amigo, um lutador e um vencedor”.
Além de considerar todas as opções diretas de envolvimento de Washington na estabilização da economia argentina, o secretário do Tesouro americano disse que empresas americanas demonstraram interesse em realizar importantes investimentos em setores da Argentina. No início da semana, o Banco Mundial anunciou que vai acelerar a liberação de US$ 4 bilhões em investimentos e financiamentos público-privados na Argentina, em apoio às reformas de Milei.
Essa relação aparentemente amigável entre os líderes da direita americana e argentina é fruto de uma convergência em temas-chave, como a defesa da liberdade. Em diferentes oportunidades, Trump e Milei destacaram a liberdade como central em seus governos.
Em contrapartida, o líder republicano acusa o Brasil de graves violações de liberdade, o que motivou diversas medidas da Casa Branca contra o governo e autoridades brasileiras.
Essas denúncias se voltam principalmente ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), alvo de sanção com base na Lei Magnitsky nos Estados Unidos. Sua esposa, a advogada Viviane Barci, também foi sancionada nesta semana após ser classificada como parte da “rede de apoio” do magistrado. Os vistos de Moraes e outros ministros do STF também foram revogados em julho.
Trump acusa o Brasil de perseguir politicamente o ex-presidente Jair Bolsonaro, condenado neste mês a 27 anos de prisão. Para o presidente dos Estados Unidos, a situação de Bolsonaro é semelhante ao que ele mesmo experimentou antes de vencer as eleições de seu segundo mandato presidencial.
Por essas razões, Trump e o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), vivem uma relação de crescente tensão. Desde a posse do republicano, há oito meses, as duas autoridades não conversaram diretamente, apesar da expectativa de um encontro nos próximos dias, depois do discurso do americano na ONU, no qual acusou o governo brasileiro de censura, violação de direitos humanos, mas citou uma “química” com o petista após um breve contato nos corredores das Nações Unidas.
Alinhamentos e divergências na política externa
Além do alinhamento na condução da política interna, Trump e Milei mantêm posições semelhantes em relação ao cenário internacional.
Um dos pontos de convergência de maior destaque é o apoio irrevogável de ambos a Israel, principalmente em um momento no qual o país do Oriente Médio é isolado no cenário internacional devido à continuidade da pressão contra o Hamas na Faixa de Gaza. Recentemente, vários países europeus, incluindo Reino Unido e França, reconheceram um Estado palestino.
Trump e Milei recorrentemente criticam declarações e refutam relatórios da ONU e de outras organizações internacionais que são recebidos positivamente pelo grupo terrorista Hamas. Para o libertário argentino, essas organizações manipulam dados com o objetivo de enfraquecer o governo israelense.
No mesmo sentido, Trump tem mantido seu apoio a Israel e pressionado o Hamas a entregar as armas e se render para que o fim da guerra seja consentido. As duas autoridades defendem uma reforma da ONU que, segundo eles, se tornou ineficaz para solucionar os conflitos no mundo.
Por outro lado, o presidente Lula renovou suas críticas a Israel no discurso da ONU, na última terça-feira (23), quando novamente acusou o país de “genocídio”, algo que ele repetidamente fez em discursos públicos.
“Nada justifica o genocídio em curso em Gaza”, afirmou o petista, que em seguida tentou amenizar a fala dizendo que “os atentados terroristas perpetrados pelo Hamas são indefensáveis sob qualquer ângulo”.
Assim que chegou em Nova York para a Assembleia Geral, nesta semana, Lula deu uma entrevista à emissora americana PBS, na qual voltou a declarar que Trump se acha o “imperador e dono do mundo” e que é “inacreditável” que o presidente dos Estados Unidos imponha tarifas tão altas ao Brasil, atitude classificada pelo petista como “absurda”.
Os efeitos de um encontro entre Lula e Trump nos próximos dias ainda são inesperados. Em entrevista coletiva na sede das Nações Unidas após o discurso do republicano, o presidente do Brasil revelou que ele disse no breve contato com seu homólogo americano que eles “têm muito o que conversar”.
Lula, que atribuiu as decisões de Trump em relação ao Brasil ao fato de ele estar “mal informado”, disse ainda que o encontro deve acontecer “o mais rápido possível” e expressou confiança de que, “quando Trump tiver a informação correta”, pode ser que mude de opinião. Ele acrescentou que não haverá limites na conversa, mas advertiu que a soberania brasileira é a única coisa “inegociável”.
“Temos 80 anos, não há motivo para estarmos brincando. Eu o trato com o respeito que um presidente dos EUA merece, e ele me respeitará como presidente da República Federativa do Brasil”, declarou o petista.