Deputados e senadores, principalmente de partidos de esquerda, teriam apresentado emendas redigidas pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), alvo da Polícia Federal por descontos irregulares no INSS, para alterar a medida provisória 871/2019, apresentada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para coibir fraudes em aposentadorias e pensões.
Entre os dispositivos aprovados, a MP determinava que as permissões para os descontos automáticos na conta dos aposentados teriam de ser revalidadas todo ano a partir de 2020, pelos próprios beneficiários.
A coluna do jornalista Tácio Lorran, do portal Metrópoles, analisou os metadados de 578 emendas e descobriu que 96 delas têm o nome da Contag ou da advogada da confederação como verdadeiros autores das propostas, apesar das assinaturas de 15 deputados e senadores.
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Entre os pleitos defendidos pela entidade estava justamente a derrubada da revalidação anual dos descontos associativos. Durante a análise da MP, o Congresso decidiu que a as permissões de descontos deveriam ser revistas a cada três anos. Passado esse prazo, em 2022, outra MP revogou definitivamente qualquer revalidação.
A Polícia Federal e a Controladoria-Geral da União (CGU) investigam um esquema que pode ter desviado R$ 6,3 bilhões em descontos associativos não autorizados em benefícios, entre 2019 e 2024. A Contag recebeu cerca de R$ 2 bilhões em descontos associativos neste período.
As propostas sustentavam que a imposição da revalidação seria “praticamente inviável”. Parlamentares do PT, Psol, PCdoB, PL, MDB e PSD assinaram as proposições. Os petistas defenderam que agiram em nome da bancada contra uma MP que, segundo eles, criaria “dificuldades para beneficiários” e retiraria direitos, não para favorecer fraudes.
O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), informou ao Metrópoles que se opôs à MP 871/2019 e que tratava-se de uma iniciativa da bancada do PT. Na mesma linha, o senador e atual presidente do partido, Humberto Costa (PT-PE), assinou como autor três emendas da Contag e argumentou que agiu como líder da bancada na época.
O ex-senador e ex-presidente da Petrobras Jean Paul Prates (PT-RN) assinou 11 proposições redigidas pela Contag. Prates também disse ao portal que as emendas faziam parte de um bloco apresentado pela bancada do PT para evitar a retirada de benefícios e garantir a atuação de “sindicatos honestos”. O ex-senador Paulo Rocha (PT-PA) também teria assinado propostas da entidade para alterar a MP.
O deputado federal Zé Neto (PT-BA) assinou 11 propostas de mudança da Contag para a MP. Ele declarou que o objetivo era proteger os sindicatos e associações de trabalhadores rurais e que seus textos não tinham relação com fraudes.
Na Câmara, também assinaram proposições da Contag: Patrus Ananias (PT-MG), Valmir Assunção (PT-BA), Marcon (PT-RS), Rubens Pereira Júnior (PT-MA), Otto Alencar Filho (PSD-BA), Daniel Almeida (PCdoB-BA), Tereza Nelma (PSD-AL) e Celso Maldaner (MDB-SC).
O deputado federal João Carlos Bacelar (PL-BA) negou relação com a Contag e não soube explicar a origem da emenda. Já a deputada federal Jandira Feghali (Psol-RJ), autora de 3 textos redigidos pela Contag, informou que seu gabinete analisa demandas recebidas e as atende se estiverem de acordo com o avanço da legislação e dos direitos dos trabalhadores.
A Contag, por sua vez, “repudia generalizações” e afirma que a MP 871/2019 visava suspender benefícios, justificando sua atuação para garantir direitos da categoria.
“Com mais de 60 anos de história e respeitada entre os parlamentares, a Contag repudia qualquer tentativa de generalização que coloque organizações sérias no mesmo patamar que estruturas criadas para fraudar o sistema previdenciário. O movimento sindical rural coordenado pela Contag é legítimo e seguirá na luta pelos interesses da categoria”, disse a entidade ao Metrópoles.