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MST se aproxima da China inspirado em modelo criado após reforma que matou milhões

Com apoio do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) tem se aproximado cada vez mais da China por meio de parcerias com universidades e empresas estatais.

A intenção é trazer para o Brasil tecnologias e processos do modelo de agricultura familiar do país asiático, que passou por uma violenta reforma agrária nos anos 1940 e 1950 que resultou na morte de milhões de membros das elites da época.

A aproximação mais recente entre o movimento e a ditadura chinesa teve início em 2022, por meio de um memorando de entendimento assinado entre a China Agricultural University (CAU) e o Consórcio Nordeste, que ficou conhecido nacionalmente pela atuação durante a pandemia de Covid-19 de forma independente do governo federal, na gestão de Jair Bolsonaro (PL).

Passada a crise sanitária, a entidade, que reúne todos os governos estaduais da região, passou a desenvolver ações em outras áreas para além da saúde, como a agricultura familiar.

O MST entrou no acordo por meio da Associação Internacional para a Cooperação Popular (Baobab), uma organização “que promove a cooperação em ciência e tecnologia entre os povos das várias comunidades do Sul Global, com o objetivo de desenvolvimento social e agroecológico”, como descreve em seu site oficial.

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“Nós temos um coletivo de militantes do MST, pesquisadores que estão na China já há cinco ou seis anos. Fomos graças ao primeiro convênio que construímos com o Consórcio Nordeste”, contou João Pedro Stédile, liderança nacional do movimento, em entrevista à CartaCapital, na semana passada.

Parceria do MST com China é apoiada pelo governo Lula

Apoiado pelo governo Lula, o MST ampliou a interlocução com a ditadura chinesa sob a prerrogativa de atender às necessidades de pequenas propriedades e da agricultura familiar em assentamentos da reforma agrária.

Em novembro de 2023, uma delegação do MST esteve na China para articular parcerias com a CAU para a construção de um centro de pesquisa na Universidade de Brasília (UnB) – a então reitora da instituição, Márcia Abrahão, integrou a comitiva do movimento.

Chamado de Centro Brasil-China de Pesquisa, Desenvolvimento e Promoção de Tecnologia para Agricultura Familiar, o instituto estabeleceu como uma de suas primeiras iniciativas o intercâmbio de informações nas áreas de bioinsumos e de maquinário agrícola para agricultura familiar.

Dezenas de equipamentos como colheitadeiras, plantadeiras e adubadeiras de pequena escala foram doados pela China para serem testados no Brasil. Em fevereiro de 2024 desembarcaram 31 máquinas, para serem usadas em assentamentos do MST no Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Maranhão.

Outras 70 unidades foram enviadas para Brasília para utilização na Fazenda Água Limpa, da UnB, e em assentamentos do Distrito Federal. Depois de os testes mostrarem viabilidade de empregá-las no contexto brasileiro, a China agora pretende instalar fábricas de maquinário agrícola para o MST no Brasil.

Stédile, do MST: “Nós aprendemos com o Mao”

O movimento considera que a chegada dos equipamentos representa uma “reparação histórica” para a agricultura familiar, nas palavras de uma dirigente da coordenação nacional do movimento que esteve na China para negociar a instalação da fábrica no Brasil.

A parceria também prevê a instalação de um centro de big data, que servirá para otimizar e adaptar as máquinas para o território brasileiro, segundo disse a atual reitora da UnB, Rozana Naves, em um evento, no fim do ano passado, que contou com a presença do ministro da Educação da China, Huai Jinpeng.

Intitulado “Fórum Brasil-China: Marcos para uma nova fase de cooperação para o desenvolvimento compartilhado”, o encontro foi organizado pela UnB e pelo Instituto Taihe, da China, e patrocinado da Fundação Banco do Brasil (FBB).

Durante o evento, o ministro de Educação da China elogiou o MST pela contribuição para o desenvolvimento das parcerias entre Brasil e China na agricultura familiar, relatou o portal Brasil de Fato.

“Eu sou um entre centenas. Nós aprendemos com o Mao [Tsé-Tung], se não faz de forma coletiva não vai ter sucesso”, respondeu João Pedro Stédile, liderança nacional do movimento.

Citada pelo MST como referência, reforma agrária chinesa matou milhões de pessoas

Um dos fatores que aproximam o MST da China é o modelo de distribuição de terras para a agricultura camponesa no país asiático. Representantes do movimento costumam destacar que a controversa reforma agrária promovida por Mao Tsé-Tung democratizou o uso das terras entre camponeses.

“Além de a China ter realizado a própria Revolução Chinesa, foi realizada a reforma agrária. Então efetivamente a terra na China é democratizada, ela está na mão dos camponeses e camponesas, diferente do Brasil, onde nós temos ainda 4 milhões de famílias sem terra”, disse Débora Nunes, da coordenação nacional do MST, em entrevista publicada no portal do movimento, sobre como a experiência chinesa pode contribuir para o processo da reforma agrária brasileira.

Em agosto de 2023, durante sessão da CPI do MST na Câmara dos Deputados, Stédile também citou a experiência chinesa como um exemplo. O relator da comissão, Ricardo Salles (Novo-SP), o questionava sobre a razão para o líder do movimento ter integrado uma comitiva oficial do presidente Lula à China em abril daquele ano.

“Existe algum movimento na China análogo ao que é o MST no Brasil?”, perguntou o parlamentar. “Não, porque em 1949 eles fizeram reforma agrária”, respondeu Stédile. “Vocês que querem tanto derrotar o MST, a fórmula é simples: façam a reforma agrária e no outro dia desaparece o MST”, acrescentou.

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A reforma agrária chinesa, lançada por Mao entre o fim da Guerra Civil Chinesa e início da República Popular da China, redistribuiu 47 milhões de hectares de terras para mais de 300 milhões de camponeses, segundo o governo chinês.

O processo, no entanto, envolveu o assassinato em massa de proprietários de terras por camponeses, estimulado por alas do Partido Comunista Chinês. As estimativas para o número de mortes entre os anos de 1949 e 1953 variam de 2 milhões a 5 milhões, segundo o historiador americano Lee Feigon, no livro Mao: Uma Reinterpretação.

Além disso, entre 1,5 milhão e 6 milhões foram enviados para campos de “reforma através do trabalho”. O jornalista britânico Philip Short, autor da biografia Mao: A Life ressalta que essas estimativas excluem ainda centenas de milhares que cometeram suicídio.

No livro Violência e a História da Desigualdade, o historiador austríaco Walter Scheidel cita que condenados como senhores de terras foram enterrados vivos, desmembrados, estrangulados ou baleados.

Já o historiador chinês Su Yang descreve, na obra Assassinatos coletivos na China Rural Durante a Revolução Cultural (tradução livre) que em muitos vilarejos, mulheres foram “redistribuídas” como concubinas ou filhas para os camponeses ou forçadas a casar com os perseguidores de seus maridos.

Embora não houvesse consenso no Partido Comunista Chinês sobre o emprego da violência no processo de redistribuição de terras, a estratégia estava de acordo com a forma como Mao entendia o processo.

No Relatório sobre uma Investigação do Movimento Camponês em Hunan, escrito em 1927, ele já rejeitava a ideia de uma reforma agrária pacífica.

“Está tudo bem. Não é ‘terrível’ de jeito nenhum. É tudo menos ‘terrível’. ‘É terrível!’ é obviamente uma teoria para combater a ascensão dos camponeses em prol dos senhores de terras; é obviamente uma teoria da classe dos senhores de terras para preservar a antiga ordem feudal e obstruir o estabelecimento da nova ordem democrática; é obviamente uma teoria contrarrevolucionária”, registrou o líder comunista chinês.

China anuncia instalação de duas fábricas de máquinas agrícolas para o MST no Brasil

Em julho, a chinesa Sinomach Digital Technology Corporation assinou um memorando de entendimento com a prefeitura de Maricá (RJ) e a OZ.Earth, empresa brasileira de agrotecnologia.

O acordo prevê a integração da produção industrial tradicional, com fornecimento de máquinas agrícolas para assentados, auxílio no desenvolvimento da indústria de alta tecnologia e uma plataforma de gestão digital agropecuária a ser implementada em territórios da reforma agrária.

O prefeito de Maricá, Washington Quaquá (PT), anunciou dias atrás que já definiu a área onde será instalada a fábrica na cidade, entre o distrito de Ponta Negra e o bairro Espraiado. “Parceria nossa com o MST para suprir a carência de tratores do Brasil”, disse.

De acordo com a prefeitura do município fluminense, serão produzidos anualmente dois mil tratores de 25 e 50 cavalos de potência, considerados ideais para pequenas propriedades. A estimativa é que sejam criados entre 200 e 250 empregos diretos.

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Em uma reunião no início de setembro, o embaixador da China no Brasil, Zhu Qingqiao, afirmou ao ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, que já estão confirmadas duas plantas industriais no país: além da de Maricá, haverá outra no Rio Grande do Norte. Além disso, segundo Teixeira, será criado um centro de serviços em Londrina (PR).

“Nós pedimos a ele se pode consultar as demais fábricas chinesas para implantarem [unidades] aqui no Brasil”, disse o ministro em vídeo publicado em suas redes sociais. “Ele também se comprometeu de dar velocidade à instalação dessas indústrias no Brasil.”

No fim do ano passado, em entrevista à agência estatal chinesa Xinhua, Stédile afirmou que, após visitar a China e reunir-se com representantes de cinco grandes empresas do setor, trabalhava com a perspectiva de pelo menos seis fábricas chinesas no Brasil.

“Uma fábrica de colheitadeiras em Açailândia, que é para o Amazonas; uma fábrica no Ceará, que é para triciclo; uma fábrica em Mossoró, para trator pequeno; outra fábrica de colheitadeiras médias em São Paulo e outra fábrica de colheitadeiras de arroz no Sul. Agora, a prefeitura de Maricá também quer instalar uma pequena fábrica de tratores em Maricá, no Rio de Janeiro”, disse, na época.

Com isso, segundo ele, seria possível cobrir todas as regiões do país, atendendo às necessidades dos assentados.

“O governo [Lula] já se comprometeu a orientar os bancos públicos, neste caso, o Banco do Nordeste, a Fundação da Amazônia e o Banco do Brasil, para que possam financiar o projeto”, acrescentou ele.

Em maio, durante visita de comitiva do governo à China, o MDA e o Ministério da Agricultura e Assuntos Rurais da China assinaram um memorando de entendimento para impulsionar a mecanização e a tecnificação da agricultura familiar no Brasil.

O documento prevê o fortalecimento das relações institucionais, de investimento e de pesquisa entre China e Brasil no âmbito do setor agrícola de pequena escala, com foco no avanço de tecnologias, maquinário especializado e a aplicação de energia renovável, especialmente voltada para a agricultura familiar e pequenos agricultores.

Parceria do MST com China também prevê fábricas de fertilizantes orgânicos e painéis solares

Em março deste ano, uma comitiva de parlamentares ligados ao MST passou 11 dias em visita oficial à China, a convite da ditadura de Xi Jinping.

Participaram da viagem os deputados estaduais Goura (PDT), do Paraná, Marina do MST (PT), do Rio de Janeiro, Mauro Rubem (PT), de Goiás, Missias do MST (PT), do Ceará, e Rosa Amorim (PT), de Pernambuco, além dos vereadores de Caruaru (PE) Edilson do MST (PT) e de Parauapebas (PA) Tito do MST (PT).

Além de visita à fábrica da Sinomach para conhecer as máquinas agrícolas utilizadas no sistema de produção chinês, os parlamentares foram apresentados a um projeto que envolve representantes do MST e da CAU para tratamento de resíduos orgânicos e geração de bioinsumos.

“Aplicar esse tipo de novidade tecnológica pode significar uma verdadeira revolução em nossas cidades, que carecem de uma política pública de compostagem urbana”, relatou Goura. “Uma tecnologia dessas significa economia de dinheiro público, efetividade ambiental, com benefícios múltiplos: ambientais, sociais e econômicos.”

“A governança de Xi Jinping acumula experiências valiosas em extensão rural, mecanização e uso de inteligência artificial aplicadas à pequena produção, além de um histórico recente de superação da fome em áreas rurais”, disse Marina em artigo publicado no site da Fundação Perseu Abramo, centro de formação do PT.

“Por sua vez, o Brasil possui uma vasta rede de movimentos sociais, cooperativas, escolas técnicas e saberes tradicionais, que podem dialogar com essas experiências em pé de igualdade”, acrescentou.

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Durante um evento sobre reforma agrária em São Paulo em maio, Stédile anunciou que a parceria com a China já prevê a instalação de ao menos cinco fábricas de fertilizantes orgânicos no Brasil.

A tecnologia, segundo ele, já é utilizada em larga escala no país asiático e permite transformar resíduos orgânicos em adubo pronto para uso em apenas sete dias. A apresentação foi feita ao lado da ministra das Mulheres, Márcia Lopes.

“Vamos começar com cinco fábricas: em Nova Santa Rita [RS], Curitiba, Belo Horizonte, Feira de Santana [BA] e no Ceará. A primeira delas já está com protocolo pronto para ser assinado agora, com a presença do presidente Lula”, disse Stédile.

Ele também mencionou o plano de utilizar energia solar nas agroindústrias do movimento em parceria com a China.

“Vamos buscar essa tecnologia fora, porque aqui no Brasil a pesquisa pública está muito amarrada ao agronegócio. A Embrapa é importante, mas precisa mudar a linha de pesquisa e atender às necessidades da agricultura de alimentos e do campesinato”, afirmou.

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