A tarifa de 50% imposta pelos Estados Unidos a produtos brasileiros acendeu um alerta no setor do açaí, especialmente no Pará, estado que concentra 94% da produção nacional do fruto. A medida chega em um momento no qual o Pará se prepara para sediar a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP 30) e vive expectativas de novos investimentos.
Segundo o supervisor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) no Pará, Everson Costa, o tarifaço representa um revés. “Com a COP 30, temos possibilidade de grandes investimentos chegando. Mas esse tarifaço acaba sendo um balde de água fria”, afirmou à Gazeta do Povo. Ele diz que a medida interfere no planejamento de qualificação e agregação de valor ao açaí.
Os Estados Unidos são o principal destino das exportações paraenses do produto, respondendo por cerca de 40% das vendas externas do estado. Em 2023, o Pará exportou 61 mil toneladas de açaí, o equivalente a US$ 45 milhões, segundo dados mais recentes disponíveis pela Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisas (Fapespa).
“Estamos falando de um volume de negócios que chega a R$ 320 milhões”, aponta Costa. A interrupção nas exportações afeta diretamente a renda dos trabalhadores. A estimativa do Dieese é de que 300 mil pessoas estejam envolvidas na cadeia produtiva do açaí na Região Norte brasileira, em sua maioria de forma informal. Só em Belém, mais de 15 mil famílias dependem da atividade dos chamados “batedores” de açaí.
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Com uma cadeia produtiva marcada pela atuação artesanal e familiar, o setor procura alternativas ao mercado norte-americano — e não há pronta solução. A Associação Brasileira dos Produtores Exportadores de Frutas e Derivados manifestou preocupação com a medida adotada pela gestão de Donald Trump.
O presidente da entidade, Guilherme Coelho, afirma que o comércio de exportação de frutas para os EUA rendeu US$ 148 milhões em 2024, com perspectiva de crescimento para este ano — até vir o anúncio do tarifaço. Ele também defende maior articulação dos governos estaduais brasileiros na tentativa de reverter a decisão.
“É preciso convencer o mercado norte-americano da necessidade dos produtos brasileiros”, afirma Everson Costa, do Dieese. Grandes empresas do setor ainda indicam redesenhar suas estratégias diante da nova tarifa.
Não faz sentido taxar um produto saudável que em nada altera a balança comercial entre os países.
Diretor-executivo da Frooty, Fábio Carvalho
Procurada pela Gazeta do Povo, a Oakberry, marca brasileira de açaí com presença global e mais de 40 lojas nos Estados Unidos, informou que não se pronunciaria sobre o tarifaço, mas reforçou “compromisso de longo prazo” com o mercado norte-americano. Já a Frooty, que detém cerca de 40% de participação no mercado brasileiro, respondeu por meio do diretor-executivo, Fábio Carvalho. “Não faz sentido taxar um produto saudável que em nada altera a balança comercial entre os países”, diz o executivo.
Carvalho aponta o risco para os empregos no Norte, enquanto afirma que a empresa continuará firme em sua atuação. “Com ou sem tarifas, não iremos renunciar às nossas composições. Espero que o governo americano reveja a decisão. Estamos falando de um produto nutritivo e que é produzido somente no Brasil”, afirma.
Enquanto as negociações seguem, produtores buscam alternativas. No Amapá, uma cooperativa suspendeu o envio de 11 toneladas de açaí aos EUA e estuda redirecionar a carga para países da Europa.
Everson Costa, no entanto, adverte que essa não é uma transição simples. Redirecionar exportações exige adequação a normas sanitárias e comerciais diferentes, revisão de planos de negócio e de margens de lucro. “Isso não acontecerá da noite para o dia”, alerta.