Com o desprendimento de quem dispõe de dinheiro alheio, o presidente Lula vai distribuindo bondades. Já anunciou energia elétrica e gás de cozinha gratuitos, e agora encomendou à Fazenda um jeito de oferecer transporte coletivo de graça.
Você sabe que não existe almoço grátis – nem botijão, luz ou ônibus de custo zero. Alguém pagará. Não é essa a preocupação do presidente.
Ele pode, claro, argumentar que suas iniciativas miram o bem-estar de dezenas de milhões de brasileiros. Que governa para quem precisa e não para os ricos, que podem se virar sozinhos. Que o dinheiro poupado por beneficiários de gratuidades vai girar a roda da economia, favorecendo até os empresários.
Faz sentido. A ideia mais recente, por exemplo, é digna de discussão. Subsídio ao transporte coletivo facilita o acesso dos mais pobres a serviços e empregos, com algum estímulo à atividade econômica local, e pode desafogar o trânsito, ajudando até quem se desloca de carro.
Dito isso, a lista de presentes que Lula vai embrulhando às vésperas do ano eleitoral reitera muito do que conhecemos dele, em especial sua noção de que governar é essencialmente sanar necessidades imediatas via dinheiro, isenções e afins. Alguém pagará.
O Brasil de Lula, dos governos petistas, é um país que de fato consome e cresce mais, à base de estímulos. Até que chega o ponto de exaustão, como vimos na gestão Dilma. O dinheiro do contribuinte e sua disposição de financiar o governo têm limite, afinal.
Esse Brasil de Lula, tão ocupado com o agora, também é um país que não consegue aumentar a produtividade (a geração de riquezas por trabalhador ou capital aplicado) e, portanto, não sabe do que viverá quando a população em idade ativa começar a diminuir. É logo: projeções indicam que o número de brasileiros com 15 a 64 anos entrará em declínio daqui a uma década.
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De onde Lula vai tirar dinheiro?
Mas voltemos ao agora. Zerar a conta de luz da baixa renda (“Tarifa Social”) custará R$ 3,6 bilhões ao ano, a serem cobrados dos demais consumidores. O vale-gás (“Gás do Povo”), R$ 5,1 bilhões, do Orçamento da União. Isso já está contratado.
O custo do vale-transporte, ainda em estudo, vai depender de sua extensão. Se o objetivo for tarifa zero no país todo e na semana inteira, pode passar de R$ 50 bilhões. Versão mais modesta, para fins de semana e feriados, sairia por mais de R$ 4 bilhões.
De onde virá tanto bilhão, se o governo opera no cheque especial e só cumpre as metas fiscais graças a artifícios? Virá do lugar de sempre: empréstimos. Ainda que a dívida seja sempre rolada adiante, seu crescimento sem freio tem preço. Quem precisa pegar dinheiro no banco que o diga. Investir, olhar para o futuro, custa caro no Brasil.
O presidente, de todo modo, talvez se sinta recompensado pelo esforço em agradar certa fatia do eleitorado. De julho a setembro, sua aprovação entre beneficiários do Bolsa Família subiu de 50% para 64%, segundo pesquisa Genial Quaest.
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Lula terá de enfrentar a ruína dos Correios
Há, porém, um problema que ele terá dificuldades em empurrar para a frente: os Correios. A estatal, que o petista tirou da lista de privatizações assim que voltou ao governo, definha em público. Adia pagamentos a fornecedores e logo pode atrasar salários. Se usasse todos os bens e o dinheiro em caixa para pagar o que deve, ainda faltariam R$ 9 bilhões.
A atual gestão acusa o governo Bolsonaro de ter sucateado a empresa, interessado que estava em passá-la adiante. O jogo de culpa não traz um centavo para os cofres. A cada dia cresce a chance de que o governo faça um aporte para socorrer a estatal e de que ela seja reclassificada para “dependente do Tesouro”.
Vale acrescentar que cobrir os passivos não significa torná-la viável. O ambiente é de concorrência feroz, e empresas que contratavam os Correios têm preferido fazer entregas por conta própria. Para se ter referência dos montantes envolvidos: apenas o Mercado Livre investiu R$ 23 bilhões em 2024 e programou R$ 34 bilhões para 2025.
De onde virá o dinheiro para salvar os Correios? Do lugar de sempre, supõe-se, e talvez excluído das regras fiscais, pois não faltará quem argumente se tratar de uma emergência. Alguém pagará.