O governo da Dinamarca ofereceu nesta quarta-feira (27), pela primeira vez, um pedido de desculpas oficial às milhares de mulheres da Groenlândia que tiveram DIUs implantados, em muitos casos sem autorização, durante décadas.
Trata-se de um dos temas mais polêmicos na relação entre Dinamarca e Groenlândia — território autônomo que faz parte do Reino dinamarquês —, que tem cobrado o governo americano por supostas interferências políticas.
“Reconhecemos que este caso tem sido motivo de raiva e dor para muitos groenlandeses e muitas famílias na Groenlândia. E, naturalmente, tem sido importante para a maneira de se perceber a Dinamarca e a Comunidade do Reino [que inclui também as Ilhas Faroe]”, disse em um comunicado a primeira-ministra dinamarquesa, Mette Frederiksen.
Frederiksen condenou o “abuso” cometido pelas autoridades de saúde dinamarquesas e falou da importância da Dinamarca assumir sua “responsabilidade” e aprender com o ocorrido.
“Perdão às meninas e mulheres que foram alvo de discriminação sistemática por serem groenlandesas, por terem sofrido danos físicos e psicológicos, por termos falhado com elas”, afirmou Frederiksen, que estendeu as desculpas a outros “capítulos obscuros” do tratamento dado aos groenlandeses.
A emissora de televisão pública dinamarquesa DR revelou há alguns anos que pelo menos 4,5 mil mulheres e adolescentes (algumas com apenas 12 anos) tiveram DIUs implantados, em vários casos sem consentimento e com danos físicos e psicológicos posteriores, da década de 1960 até 1991, quando a Groenlândia assumiu a saúde de seu território.
A iniciativa obedeceu a uma campanha estatal de planejamento familiar de um território que em 1953 havia abandonado seu status de colônia para se tornar uma província dinamarquesa e estava imerso em um plano de modernização.
Seus defensores argumentam que a campanha obedeceu a um planejamento familiar estudado — na época, a ilha tinha uma das taxas de natalidade mais altas do mundo — e para reduzir os abortos indesejados entre as jovens, e apontam também que as autoridades groenlandesas não se opuseram.
O caso está sendo investigado por uma comissão conjunta, que deve anunciar suas conclusões no próximo mês, e é alvo de uma ação coletiva de 143 mulheres da Groenlândia contra o Estado dinamarquês por violar seus direitos humanos, na qual pedem uma indenização de 43 milhões de coroas (cerca de R$ 36 milhões).
O governo da Groenlândia também abriu outra investigação paralela sobre a manutenção da prática de 1992 até hoje e já destinou 4,5 milhões de coroas (cerca de R$ 3,8 milhões) para o pagamento de possíveis indenizações.
“Quero pedir desculpas, em nome do governo groenlandês, pelo dano e abuso que várias mulheres podem ter sofrido depois que assumimos as competências em saúde”, disse no mesmo comunicado o presidente autônomo, Jens-Frederik Nielsen.
Seu antecessor no cargo, Múte B. Egede, havia classificado o caso no ano passado como “genocídio”.
Ambos os governos anunciaram que haverá um ato oficial conjunto de desculpas quando o relatório for apresentado.