A deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) foi presa nesta terça-feira (29) na Itália. A informação foi confirmada pela Polícia Federal, que disse que a “medida é resultado de cooperação policial internacional entre a Polícia Federal, a Interpol e agências da Itália”. A defesa de Zambelli, porém, afirmou que a deputada decidiu se entregar às autoridades italianas.
“Na tarde de hoje, minha cliente, a deputada Carla Zambelli, decidiu se entregar às autoridades italianas, a fim de colaborar administrativamente com os pedidos das autoridades, mostrando o seu endereço, mostrando que nunca foi foragida na Itália e estava esperando um posicionamento oficial para que ela pudesse se apresentar”, disse o advogado Fabio Pagnozzi. Ela tenta não ser extraditada ao Brasil.
A PF, por sua vez, informou em nota que “a presa era procurada por crimes praticados no Brasil e será submetida ao processo de extradição, conforme os trâmites previstos na legislação italiana e nos acordos internacionais dos quais o Brasil é signatário”.
A ordem de prisão contra Zambelli foi expedida pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), em 7 de junho. Com isso, foi determinada a execução imediata da pena de 10 anos de prisão, inicialmente em regime fechado.
A parlamentar deixou o Brasil em maio. Inicialmente, ela viajou para os Estados Unidos e se mudou para a Itália, pois tem cidadania italiana. Zambelli anunciou sua saída do país no dia 3 de junho. Um dia depois, a Polícia Federal pediu a inclusão do nome da deputada na difusão vermelha da Organização Internacional de Polícia Criminal (Interpol). A lista serve para alertar as polícias dos 196 países membros sobre fugitivos procurados internacionalmente.
O líder do PL na Câmara, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), foi um dos primeiros colegas a prestar apoio a Zambelli. Disse que ela teria se apresentado “espontaneamente” à polícia para começar seu pedido de asilo político e de não extradição e que o partido segue firme ao lado dela “contra toda essa perseguição política”.
Parlamentar italiano diz ter informado a polícia sobre localização de Zambelli
Mais cedo, o deputado italiano Angelo Bonelli afirmou ter localizado o apartamento em que a deputada estaria em Roma. Ele disse ter encaminhado as informações à polícia italiana. “Carla Zambelli está em um apartamento, em Roma. Forneci o endereço à polícia, neste momento a polizia esta identificando Zambelli”, disse Bonelli no X.
Em entrevista à GloboNews nesta tarde, o deputado disse ter comunicado as autoridades por ter ouvido Zambelli falar em uma entrevista à CNN Brasil que era “intocável” na Itália por ser cidadã italiana. “Não é possível que uma pessoa fale assim”, afirmou Bonelli.
Zambelli foi condenada por invasão ao sistema do CNJ
Zambelli foi condenada pela Primeira Turma do STF pela invasão ao sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Além da pena de prisão, o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, determinou a perda do mandato e o pagamento de multa no valor de R$ 2 milhões em danos materiais e morais.
O hacker Walter Delgatti Neto, que teria atuado a mando de Zambelli, foi condenado a 8 anos e 3 meses de reclusão, inicialmente em regime fechado, além do pagamento solidário da multa imposta. O relator declarou a inelegibilidade dos dois por 8 anos, contados a partir da condenação.
As investigações apontaram que Zambelli teria usado sua estrutura parlamentar para facilitar o ataque cibernético, inserindo documentos falsos no sistema oficial do Judiciário. A ação foi interpretada como tentativa de constranger ministros do STF. A parlamentar nega participação no crime.
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Próximos passos
Nas próximas horas, a polícia italiana deve decidir se mantém a prisão de Zambelli, se ela cumprirá prisão domiciliar ou se a parlamentar será extraditada. O Brasil e a Itália assinaram um Tratado de Extradição em 1989. Segundo o artigo 6 da norma, ter a cidadania italiana não impede a entrega da deputada ao Brasil. Outros pontos que podem pesar contra Zambelli é que a parlamentar não nasceu no país europeu e também nunca viveu lá. O texto estabelece que a recusa, neste caso, será facultativa.
“Quando a pessoa reclamada, no momento do recebimento do pedido, for nacional do Estado requerido, este não será obrigado a entregá-la. Neste caso, não sendo concedida a extradição, a Parte requerida, a pedido da Parte requerente, submeterá o caso às suas autoridades competentes para eventual instauração de procedimento penal. Para tal finalidade, a Parte requerente deverá fornecer os elementos úteis. A Parte requerida comunicará sem demora o andamento dado à causa e, posteriormente, a decisão final”, diz um trecho do tratado.
Já o artigo 26 da Constituição italiana estabelece que “a extradição do cidadão somente pode ser permitida quando expressamente prevista pelas convenções internacionais. Em hipótese alguma pode ser admitida por crimes políticos”. O caso do ex-diretor de marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, condenado no Mensalão, é um exemplo desse precedente. Ele também tinha dupla cidadania e fugiu para a Itália em 2013. No entanto, foi extraditado para o Brasil em 2015.
Declaração de Carla Zambelli sobre a prisão
O advogado Fábio Pagnozzi, que representa a deputada, divulgou um vídeo com uma declaração de Zambelli sobre a prisão. Nele, a parlamentar não especifica a data em que a declaração foi gravada. “Vou me apresentar às autoridades italianas e estou muito segura de fazê-lo, porque aqui nós temos ainda Justiça e democracia. Não temos um ditador no poder, não temos a autoridade ditatorial de Alexandre de Moraes e de seus comparsas da Suprema Corte. Estou tranquila, com a alma tranquila e o coração sereno de que aqui buscarei justiça para o meu caso”, disse a parlamentar.
Zambelli voltou a dizer que é alvo de perseguição política no Brasil e negou que tenha ordenado a invasão do sistema do CNJ. “Quando eu disse que era intocável, é porque eu sei que só Deus pode me tocar. Eu não vou voltar para o Brasil para cumprir pena no Brasil. Se eu tiver que cumprir qualquer pena, vai ser aqui na Itália, que é um país justo e democrático. Mas estou segura que analisando todos os processos, de cabo a rabo, eles vão perceber que eu sou inocente, porque eu não ordenei a invasão ao CNJ”, acrescentou.
Após ser presa, Zambelli também pode perder o mandato
No início da noite desta terça (29), o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirmou que já consultou o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, e foi informado sobre as informações preliminares. “Aguardamos as manifestações oficiais do Ministério da Justiça e do governo italiano. Importante lembrar que as providências que cabem à Câmara já estão sendo adotadas, por meio da Representação que tramita na CCJC, em obediência ao Regimento e à Constituição. Não cabe à Casa deliberar sobre a prisão – apenas sobre a perda de mandato”, disse o deputado, em nota.
Em caso de condenação criminal, o artigo 55 da Constituição estabelece que a cassação deve ser aprovada por maioria absoluta de votos na Câmara, após o trânsito em julgado da ação, ou seja, quando não existir mais possibilidade de recurso. Com isso, seriam necessários 257 votos no plenário da Casa.
No entanto, Moraes apontou que Zambelli perderá o mandato por faltas, pois a sentença prevê o cumprimento da pena inicialmente em regime fechado. Ele destacou que, quando o parlamentar se ausenta por mais de 120 dias, a Constituição determina que a cassação deve ser declarada pela Mesa Diretora da Câmara, sem deliberação no plenário.
Inicialmente, Motta disse que a Mesa Diretora iria cumprir a ordem do ministro. No entanto, o embate entre o Legislativo e o Judiciário se intensificou após a Primeira Turma restringir a decisão da Câmara que suspendeu toda a ação penal por suposta tentativa de golpe contra o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ).
Motta, então, voltou atrás e determinou que a decisão sobre a perda de mandato de Zambelli será submetida ao Plenário da Casa. “Houve uma confusão, uma precipitação da minha avaliação”, declarou. Ele explicou que a notificação recebida do STF dizia respeito apenas ao bloqueio da remuneração de Zambelli, e não à sua prisão. “Fui notificado sobre o bloqueio dos vencimentos. Não fui notificado sobre a prisão, por isso não a trouxe ao Plenário”, disse Motta na ocasião.