Novamente diante de uma multidão de simpatizantes na Avenida Paulista, em São Paulo, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) consolidou na tarde deste domingo (29) um projeto político que vai além do livramento de perseguidos do Supremo Tribunal Federal (STF) ou da sua possível volta ao poder. Foi, sobretudo, um chamamento às urnas de 2026.
Bolsonaro e os que o antecederam no discurso final não só apontaram a inconsistência da delação do tenente-coronel Mauro Cid como trunfo para desacreditar de vez o inquérito que acusa o ex-presidente de tentar dar golpe de Estado. Enalteceram a vitória mais ampla da direita nas próximas eleições, de caráter consagrador e renovador.
O organizador, pastor Silas Malafaia, e os senadores Marcos Rogério (PL-RO) e Magno Malta (PL-ES) e Flávio Bolsonaro (PL-RJ) falaram da importância da eleição da maioria direitista no Senado. Já Bolsonaro reiterou a promessa de “mudar o país” caso o eleitor lhe der metade de Câmara e Senado. Este tem sido o seu mais novo mantra.
Chamou a atenção a ênfase dada pelo ex-presidente ao tom pacificador, “sem qualquer revanchismo”, ao pontuar o papel estratégico de se eleger parlamentares do PL e, também, de aliados conservadores filiados ao PP, Republicanos, União Brasil e PSD, citados nominalmente por ele. Suas conversas nos estados confirmam a abertura.
Conquista estratégica da maioria no Congresso pela direita ganha nova ênfase
A manifestação da Paulista agrega ao apelo da direita por manter Bolsonaro na bolsa de apostas para a Presidência e desmontar a chamada “farsa do STF” o lançamento de frente ampla liderada pelo PL para conquistar o comando do Legislativo e, por tabela, fazer frente ao Executivo e Judiciário. Nesse sentido, o objetivo supera a Presidência.
Malafaia destacou o intento de Moraes de barrar a volta Bolsonaro ao poder e o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), falou do ex-presidente “no coração do povo”, mesmo fora das urnas. Nessa toada, Bolsonaro traçou uma missão pessoal além da sua “prisão ou morte”, mirando a glória parlamentar da direita.
Apesar das ponderações, o tom de campanha se fez presente todo o tempo, seja com oradores bradando confiança na presença de Bolsonaro na disputa presidencial, embalado pelo jingle “volta, capitão”, pelo enaltecimento das realizações de sua gestão, o sucesso dos seus ministros e duras críticas a Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O ex-presidente chegou a classificar a eleição de Lula como “o verdadeiro golpe”, urgido desde quando foi liberado da prisão e com “mão grande do TSE” na corrida eleitoral. Ele também ressaltou o “vexame” do atual mandato do petista, com insucesso em várias áreas, e que pode ainda causar prejuízos por alinhar ao Irã no conflito com Israel.
Apesar de inelegível, Bolsonaro mostra mobilização popular como diferencial
Inelegível pela Justiça Eleitoral até 2030, acossado por provável condenação penal nos próximos meses em julgamento STF por encabeçar suposta trama golpista e ainda enfrentando recorrentes problemas de saúde, Bolsonaro segue ainda resguardando para si o posto de maior líder da direita no país. Nos bastidores, as negociações continuam.
Desde 2024, quando os grandes protestos populares de rua voltaram, após o trauma do encarceramento de centenas de cidadãos envolvidos no 8 de Janeiro e de seguidas ameaças de indiciamento de líderes conservadores, Bolsonaro consolidou sua narrativa ao longo de cinco grandes atos públicos.
Em diferentes fases que se acumularam à cada protesto, o ex-presidente atingiu – senão totalmente, mas ao menos parcialmente – todos objetivos, começando por dar visibilidade nacional e, sobretudo, internacional às sus denúncias de revesses da democracia, da liberdade e da Justiça no Brasil.
Bolsonaro conseguiu ainda liderar mobilizações da sociedade em pautas da oposição e da direita, especialmente para explicitar a parcialidade do STF. Desde que deixou a Presidência, ele consolidou o diferencial de atrair gente para locais públicos, em claro contraste com a esquerda e o presidente Lula.
Ausências podem sinalizar ressentimentos de aliados com acordos do PL nos estados
Envolvido com a conquista de uma frente ampla articulada com forças nos estados, Bolsonaro também pode ter colhido os primeiros desconfortos com aliados próximos, a exemplo da insatisfação da deputada Júlia Zanatta (PL-SC) por ter de ceder sua candidatura ao Senado para Carlos Bolsonaro.
A ausência na Paulista do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), que lidera as pesquisas para o governo mineiro, pode sinalizar aversão à aproximação de Bolsonaro com o grupo do governador Romeu Zema (Novo), dentro de um plano estratégico voltado para o segundo maior colégio eleitoral do país.
Após conseguir reunir cinco governadores de direita no encontro anterior na Paulista, Bolsonaro já tinha avisado que faria pronunciamento “diferente do que o pessoal está acostumado” – definindo-o como “uma saída e uma oportunidade”. Transpareceu o lema “tirar o PT” de lá, dito por Tarcísio.
Protestos avançaram da defesa do estado democrático para nova batalha em 2026
No quarto protesto encabeçado por Bolsonaro em 2025, o tema “Justiça já” se justificou pela pressão contra julgamento no STF, no momento que avança a fase decisiva do processo, e reivindicação de anistia, que pode avançar no contexto de desavença entre a Câmara e o Palácio do Planalto.
A partir de fevereiro de 2024, os protestos evoluíram da tônica cuidadosa da defesa do Estado Democrático de Direito para críticas mais contundentes ao ministro Alexandre de Moraes, verbalizadas sobretudo por Malafaia. Em todos, Bolsonaro falou em pacificação é “passar uma borracha no passado.”
Também em todos foi buscada “a fotografia para todo o mundo”, que veio também acompanhada de discursos em inglês, improvisado até pelo ex-presidente. O avanço das hostilidades entre Lula e Israel e o avanço da perspectiva de sanções contra Moraes por autoridades americanas ajudou.