quinta-feira , 25 setembro 2025
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Anistia light: oposição diz que redução das penas do 8/1 pode beneficiar bandidos e facções

A escolha do deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP) como relator do projeto de anistia aos condenados do 8 de janeiro reabriu o debate sobre os rumos da proposta. O parlamentar sinalizou que deve apresentar um texto mais restrito, voltado à redução de penas — uma espécie de “anistia light” ou PL da “dosimetria”.

Mas a ideia, longe de pacificar, acendeu um alerta no Congresso. Oposição e advogados de acusados afirmam que mexer no Código Penal para suavizar punições pode gerar um efeito cascata: abrir espaço para que outros criminosos, inclusive líderes do crime organizado, se beneficiem indiretamente.

Paulinho da Força disse que seu texto não irá abrir margem para isso.

O líder da Oposição, deputado Zucco (PL-RS), afirmou que a tentativa de criar um modelo de dosimetria não atende às famílias dos presos e ainda pode ter efeitos imprevisíveis. Ele questionou, inclusive, a possibilidade de reduzir de 14 para apenas 10 anos a pena da Débora Rodrigues, que riscou de batom a estátua da Justiça.

“Essa narrativa de redução de pena não atende. Tivemos acesso a uma pesquisa com os presos e familiares: 81% só aceitam a anistia. Agora, se tentarem mexer no Código Penal, isso pode impactar outros criminosos. É algo perigoso para o país”, declarou Zucco, em entrevista à imprensa, após reunião com Paulinho, nesta terça-feira (23).

O deputado Alberto Fraga (PL-DF) reforça a preocupação e insiste que o melhor caminho para pacificação é a “anistia ampla, geral e irrestrita”. 

“Quem insistir na tese da dosimetria está reconhecendo que o processo foi falho. O Congresso não tem competência para isso. Se reduzir penas, pode estar beneficiando Marcola, Fernandinho Beira-Mar e por aí vai. É um precedente muito perigoso”, disse à Gazeta do Povo

O texto final da proposta ainda será elaborado pelo relator e deve ser apresentado para votação na próxima semana. Até o momento, não existe uma definição concreta de como se dará a redução da pena relacionada aos crimes do 8 de janeiro. As penas para os réus variam de três anos a 17 anos e seis meses de prisão.

Os crimes pelos quais foram condenados são cinco: tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, associação criminosa, dano qualificado e deterioração de patrimônio público.

Após a reunião com o PL, nesta terça-feira (23), Paulinho da Força declarou que será “sensível às famílias que estão sofrendo com as condenações” e garantiu que pretende visitar alguns dos familiares. Porém, reforçou que o objetivo é reduzir as penas, sem anistia geral. Ele também disse que “o cuidado é não soltar presos de outras condições” e por isso o seu relatório não deve contemplar “terroristas”. 

“Pretendo preparar um texto que possa reduzir as penas e livrar as pessoas que estão de certa maneira sofrendo na prisão. A gente vai pegar alguns artigos da lei [Código Penal] e reduzi-las. Nós não vamos liberar terroristas e vamos tomar esse cuidado”, declarou Paulinho.

O líder do Solidariedade, Áureo Ribeiro, saiu em defesa de Paulinho da Força. Segundo ele, o texto final será elaborado por técnicos da Câmara para evitar “brechas” e que outros criminosos sejam beneficiados. 

“Só cabe a Câmara mudar as leis e fazer mudança de lei, e se vai ter a redução de pena. Mas cabe ao Supremo Tribunal Federal aplicá-la depois. Não é um texto de um partido, é um texto coletivo, que vai precisar do consenso dos líderes”, declarou o líder. 

Advogados dos presos do 8/1 cobram anistia ampla, geral e irrestrita

Entre os advogados dos presos do 8/1, a divergência também é clara sobre o possível projeto a ser apresentado por Paulinho da Força.

Ezequiel Silveira, que defende alguns condenados, rejeita a redução de penas por considerar que os acusados já cumpriram punições excessivas. “Muitas pessoas pagaram muito mais do que deveriam, seja com bloqueio de bens, tempo de prisão ou tornozeleira eletrônica. Não tem como reduzir algo que já foi pago em excesso”, disse.

Apesar da crítica, Silveira admite que o momento político exige negociação. “A direita quer anistia ampla, geral e irrestrita. A esquerda não quer nada. O Centrão fala em dosimetria, mas algo irrisório. Nós vamos trabalhar para melhorar o texto, para que, ainda que não seja o ideal, possa ser o mais próximo possível disso e traga algum benefício concreto às famílias.”

A advogada Carolina Siebra apresentou nesta terça-feira (23) ao relator um dossiê sobre a situação dos condenados, com relatos de violações de direitos humanos e a visão das famílias favoráveis à anistia. Ela também defende que a redução de penas é insuficiente e arriscada.

“A anistia é um remédio político, porque o processo também foi político. Reduzir penas pode beneficiar outros criminosos. O que defendemos é justiça e misericórdia para os condenados, que tiveram direitos violados.”

De acordo com a advogada, os acusados não tiveram o devido processo legal e por isso a anistia seria uma “solução política justa”. Carolina reforça que muitos que se opõem à anistia “desconhecem a verdadeira história e compraram uma narrativa falsa”.

”O que seria justo é uma anulação dos processos. Não se existe anistia meio termo, meia boca, como querem pautar. A gente já tem um grande prejuízo para o Código Penal quando o ministro Alexandre de Moraes prende as pessoas e condena por associação criminosa armada quando não se tem uma arma. Se a gente traz o benefício de uma mudança na legislação, aceitando que isso é correto, aí sim a gente vai ter um prejuízo para toda sociedade”, explicou a advogada.

O STF já deixou claro que anistia para crimes contra o Estado Democrático de Direito, ou para os que atentam contra cláusulas pétreas da Constituição, é considerada inconstitucional. Isso impõe limites legais ao que o Congresso pode aprovar.

Projeto original da anistia será descartado

O texto que teve a urgência aprovada na Câmara é de autoria do deputado Marcelo Crivella (Republicanos-RJ). O projeto concede anistia a todas as pessoas que participaram de manifestações políticas e eleitorais entre o segundo turno das eleições de 2022 e a entrada em vigor da lei.

A proposta abrange desde doadores e apoiadores logísticos até aqueles que se manifestaram em redes sociais. Além das ações penais, a anistia também prevê o perdão de multas e sanções aplicadas pela Justiça, mesmo que ainda não tenham transitado em julgado, desde que relacionadas a manifestações políticas.

Na justificativa, Crivella sustenta que as manifestações refletiram a insatisfação popular com o resultado eleitoral de 2022. Para ele, a anistia seria necessária para “pacificar o país” e evitar um cenário de revanchismo político.

Apesar disso, Paulinho já sinalizou que pretende apresentar um texto totalmente diferente do original. Ele tem defendido uma alternativa baseada na dosimetria e na redução de penas, descartando a concessão de uma anistia ampla e irrestrita.

A dosimetria é o processo pelo qual o juiz define a pena final aplicada ao réu, levando em conta critérios como gravidade do crime, participação individual e circunstâncias atenuantes. Na prática, a proposta de Paulinho busca revisar as condenações, reduzindo as punições consideradas excessivas, mas sem extinguir totalmente a responsabilidade penal dos envolvidos.

Após reunião com o relator, o líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ), afirmou que a “dosimetria não é competência do Congresso Nacional”, mas do Poder Judiciário. “O que compete ao Congresso, pela nossa Constituição, é a anistia. Se alguém tiver alguma outra opção, que nos apresente”, declarou aos jornalistas.

Criminalista aponta “desvio institucional” em reduções das penas

Para o criminalista Bruno Jordano, condicionar a discussão apenas a esse critério representa um desvio institucional. Ele alerta que a tentativa de substituir o projeto de anistia aprovado em urgência por uma versão focada na dosimetria pode configurar uma “usurpação da competência do Legislativo” e um risco à separação de poderes.

“A própria ideia de ‘reformar’ o texto aprovado pela Câmara por meio da intervenção de um relator configura ato político-jurídico que desrespeita a vontade popular. O Congresso é o único titular da competência para conceder ou não anistia. Qualquer tentativa de relativizar esse poder significa ataque direto à separação de poderes.”

Jordano reforça que todos os crimes pelos quais os manifestantes do 8/1 foram condenados são passíveis de anistia. A Constituição só veda o perdão à tortura, ao tráfico de drogas, ao terrorismo e a crimes hediondos.

 “Criar categorias como ‘núcleo central’ e ‘massa de manobra’ é invenção política. A anistia é prerrogativa exclusiva do Congresso e não pode ser condicionada a requisitos ou desvirtuada em dosimetria”, afirmou, em referência à ideia de reduzir penas para manifestantes que invadiram e depredaram sob influência de líderes políticos.

“Ao tentar violar a Constituição para impedir a concessão de um benefício previsto em lei que, por manobra hermenêutica, alegando que nunca se aplicaria aos que realmente precisam, os demais poderes abrem mão de um Estado de Direito para perseguir opositores políticos”, completou o advogado criminalista.

Na prática, a redução de pena pode significar progressão de regime mais rápida, reclassificação de crimes ou diminuição do tempo de cumprimento em regime fechado — medidas que, mesmo assim, ainda precisam ser negociadas com Senado e depois aplicadas pelo Supremo Tribunal Federal em cada caso.

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