A estratégia da defesa do general Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa, de transferir a responsabilidade por um eventual golpe de Estado para o ex-presidente Jair Bolsonaro provocou reação imediata entre aliados do ex-chefe do Executivo. Durante o segundo dia de julgamento na Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), no âmbito da ação penal que investiga a tentativa de golpe, a tática de inocentar o general ao implicar Bolsonaro gerou críticas tanto nas redes sociais quanto nos bastidores políticos.
Para o deputado Sanderson (PL-RS), aliado de Bolsonaro, a manobra foi “suicida”:
— Jogou toda a responsabilidade no presidente sem apresentar nenhuma prova. Se era ele o ministro da Defesa e presenciou seu chefe sugerindo um golpe de Estado, por que permaneceu no governo até o último dia? Além de não colar, pegou muito mal para um general quatro estrelas — afirmou.
Sob reserva, outros aliados descreveram a estratégia da defesa como “sorrateira” e “desleal”. Há relatos de que a própria família de Bolsonaro teria ficado feito comentários de incômodo enquanto assistia o julgamento, no condomínio em que o ex-mandatário cumpre prisão domiciliar.
Há quem minimize o desconforto. O senador e ex-vice-presidente Hamilton Mourão focou em criticar a ação penal:
— Vejo cada defesa com sua estratégia na busca da inocência do cliente. O fato é que trata-se de um processo viciado, onde uma mesma pessoa investigou, encaminhou a acusação e agora está julgando. Isso só existe em regimes totalitários — disse Mourão, em referência às críticas de Bolsonaro sobre a condução do processo.
Continua depois da publicidade
Publicamente, quem puxou o coro de insatisfação foi o ex-secretário de Comunicação e articulador do ex-presidente, Fábio Wajngarten, que compartilhou uma crítica contundente nas redes sociais: “Eu sei muito bem qual era o ‘modus operandi’ dessa turma que vivia no bate e assopra na orelha do presidente. Criavam e distribuíam dentro do Gabinete Presidencial teorias conspiratórias para se manter vivos dentro de suas insignificâncias”.
Apesar de reafirmar respeito às Forças Armadas, Wajngarten destacou que militares do alto escalão “vilanizavam a política” mesmo antes do governo Bolsonaro: “Fizeram campanhas para avançar sobre pastas que sequer dominavam os temas básicos, motivados pelos benefícios que acompanham os cargos. Se deslumbraram por completo com microfones, garçons e motoristas que faziam parte do ‘entourage’ que nunca tiveram. Não aceitarei mentiras neste momento em que sequer o presidente possa se defender”, escreveu.
Paulo Sérgio Nogueira é um dos oito réus do chamado “núcleo crucial” da trama golpista. A defesa buscou afastar sua responsabilidade, apresentando a narrativa de que o general teria atuado para impedir medidas de exceção sugeridas por Bolsonaro. Durante o julgamento, Andrew Fernandes Farias, advogado de Nogueira, afirmou:
Continua depois da publicidade
— O general Paulo Sérgio atuou para demover o presidente de qualquer medida de exceção. A inocência do general, segundo a delação de Mauro Cid, principal testemunha de acusação, é manifesta.
O caso remete ao período final do governo Bolsonaro, quando o ex-mandatário e seu entorno teriam traçado um plano para seguir no poder, mesmo após terem sido derrotados nas urnas. Paulo Sérgio, que ocupava o Ministério da Defesa desde 2022 e tinha trajetória consolidada como general quatro estrelas, passou a ser visto como peça central. Para aliados do ex-presidente, entretanto, sua permanência no governo diante de sinais de planejamento de golpe é questionável.
Além do contexto político, o julgamento carrega forte repercussão simbólica. Ele reúne militares de alto escalão, ex-presidentes e a Suprema Corte no mesmo palco, expondo fragilidades institucionais e divergências estratégicas dentro do próprio governo passado. Até o momento, a estratégia de deslocar o foco da acusação para Bolsonaro provocou críticas intensas na base.
Continua depois da publicidade
A defesa de Bolsonaro, por sua vez, tem sustentado que o ex-presidente não participou de nenhuma tentativa de golpe e que estava fora do país quando ocorreram os atos antidemocráticos do 8 de janeiro de 2023. O julgamento continua na próxima semana, com sessões marcadas para terça-feira, quarta-feira e sexta-feira.